A comunidade ufológica brasileira está em festa.
Depois de anos de espera, eis que o governo e as Forças
Armadas acabam de liberar o terceiro e talvez mais importante lote de
documentos “secretos” a respeito de supostas aparições de óvnis (objetos
voadores não-identificados) em território nacional.
O conjunto inclui dois relatórios estatísticos, além de
filmes e gravações. A liberação dos documentos tinha sido exigida por 500
terráqueos que se reuniram no 4º Fórum Mundial de Ufologia, que aconteceu em
dezembro de 2012 em Foz do Iguaçu (PR).
Segundo o editor da revista especializada “Ufo” e
organizador do fórum, Ademar José Gevaerd, “não há motivo para os relatos
acerca de aparições ufológicas terem tratamento restritivo”.
Pelo relatório estatístico elaborado em 2001, fica-se
sabendo que a Aeronáutica catalogou 662 casos de aparições de objetos voadores
não-identificados, entre os anos 1954 e 2000. E que os anos de glória da
ufologia nacional foram 1977 e 1978, em que se registraram 85 e 63 aparições,
respectivamente.
Mas tem muito mais:
– Descobre-se que as naves espaciais alienígenas tem
estranhos hábitos notívagos. Nada menos do que 77,4% das aparições ocorreram
entre 18h e 5h59.
– Que o Estado que mais viu óvnis foi o Pará, que sozinho
registrou 133 casos. Em São Paulo, foram 97.
– Que 214 óvnis apareceram na forma de luz. Apenas 28
tinham a forma celebrizada pelos filmes de ficção científica, aquela com
aparência de um chapéu amassado.
A Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU) pretende usar os
dois relatórios para solicitar, com base na Lei de Acesso à Informação, o
“inteiro teor de todos os casos listados”, já que se supõe que cada uma dessas
alegadas aparições possa ter gerado relatórios, gravações, filmes e
fotografias.
É longo o histórico de cooperação entre a FAB e a
ufologia, um campo de interesses dado a reunir gente com imaginação além do
habitual. Desde 1954, a Aeronáutica já discutia assuntos ufológicos com a
Comissão de Investigadores sobre Discos Voadores. Em 1969, um órgão oficial foi
criado para estudar o assunto, o Sioani (Sistema de Investigação sobre Objetos
Aéreos Não-Identificados). Em 1986, o então comandante da Aeronáutica produziu
o “aviso secreto 001”, transferindo para o Comdabra (Comando de Defesa
Aeroespacial Brasileiro) a responsabilidade de reunir todos os relatos de
óvnis.
Ao Fórum de Ufologia de Foz do Iguaçu, a Aeronáutica até
enviou um representante oficial, o capitão Herbert Filgueiras. Para muitos dos
participantes, foi a chancela definitiva, o selo de qualidade que faltava na
crença de que, afinal, “não estamos sós”...
A abertura dos “arquivos X” da Força Aérea já produziu
descobertas sensacionais, como aquela que foi garimpada entre as milhares de
páginas liberadas em 2009. Trata-se de oito páginas, todas com o carimbo de
“Confidencial”, que compõem um tal “Relatório de Ocorrência de 2 de junho de
1986”, assinado pelo brigadeiro-do-ar José Pessoa Cavalcanti de Albuquerque,
comandante interino de defesa aérea do então Ministério da Aeronáutica.
O documento relata minuto-a-minuto a aparição de uma
suposta esquadrilha de óvnis voando em velocidades subsônicas e supersônicas,
além de se manter em "voo pairado" sobre a cidade de São José dos
Campos (a 94 km de São Paulo). Toda a movimentação dos 21 objetos teria sido
acompanhada por radares e visualizada pelo operador da torre de controle aéreo
de São José.
O avião Xingu prefixo PT-MBZ, que passava pela região no
mesmo momento, e que levava a bordo o então presidente da Petrobras, coronel
Ozires Silva, também teria visualizado a tal esquadrilha... Seu depoimento
enche de coragem todos os que são acusados de loucos ao relatar um avistamento:
– Quando nos aproximávamos de São José dos Campos, a
bordo do avião Xingu PT-MBZ, Brasília pediu para observarmos alguns pontos que
estavam sendo detectados pelo radar, e que não estavam registrados como vôos
regulares dentro daquela área.
– Na altura de 600 metros, vimos pontos luminosos, de cor
laranja-vermelhado, com brilho muito intenso.
– Tentamos nos aproximar das luzes, mas desistimos. As
luzes apagavam e acendiam em lugares diferentes. Observamos variações muito
rápidas de velocidade.
– As luzes tinham presenças reais, eram alvos primários
no radar, alvos positivos, uma coisa concreta.
– Se não fosse detectado pelos radares, eu não teria
falado nada.
– Está registrado em fitas pelo radar.
– Não consegui identificar nada.
As conclusões do Relatório de Ocorrência também são
estimulantes:
“Este Comando é de parecer que os fenômenos são sólidos
[ou seja, não apenas luminosos] e refletem de certa forma inteligência, pela
capacidade de acompanhar e manter distância dos observadores como também de
voar em formação, não forçosamente tripulados”.
Uau! Vem coisa muito louca por aí.
Agora, compare a atitude da Aeronáutica que faz um
relatório como esse e o libera para consulta (apesar do risco de cair no
ridículo) e a mesma Aeronáutica, que nega qualquer informação sobre o que
ocorreu nas suas dependências durante a caçada aos “inimigos políticos” do
Regime Militar implantado no Brasil entre 1964 e 1985.
A Comissão Nacional da Verdade, encarregada de apurar os
crimes contra os Direitos Humanos cometidos pelo Estado Brasileiro, havia
solicitado à Marinha, ao Exército e à Aeronáutica que lhe enviassem informações
sobre abusos ou irregularidades que ocorreram em suas unidades durante a
Ditadura.
(É mais do que notório, para ficar em apenas um exemplo,
que o militante Stuart Jones, filho da estilista Zuzu Angel, foi preso,
torturado e assassinado na Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro.)
Pois não é que a arma chefiada pelo mesmo
tenente-brigadeiro-do-ar Juniti Saito, que cumula os ufólogos de gentilezas,
teve a desfaçatez de produzir um relatório de 145 páginas em que, depois de
incrível enrolação, incluída a história da aviação praticamente desde Santos
Dumont, ousa desafiar a inteligência nacional?
“Não houve desvirtuamento do fim público estabelecido
para a Base Aérea do Galeão, no período em questão, que pudesse configurar
desvio de sua atividade regulamentar. Respeitosamente, Juniti Saito, Comandante
da Aeronáutica.”
Respeitosamente? Juniti Saito pode entender muito de extraterrestres
(e isso diz mais sobre sua mente do que sobre a existência dos pobres ETs), mas
nada entende de seres humanos, de humanidade ou de respeito.
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